APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA – Ao
abordar a temática da Aprendizagem e desenvolvimento intelectual na idade
escolar, o pensador e psicólogo russo Lev Semenovitch Vygotsky (1896-1934),
considera três categorias que envolvem a independência do processo de
desenvolvimento e do processo de aprendizagem, havendo, pois, uma oposição
entre elas e admitindo que a aprendizagem é um processo exterior ao
desenvolvimento, em conformidade com o que defende Piaget; a de que a
aprendizagem é desenvolvimento, havendo assim um paralelismo ou simultaneidade
entre ambas; e a de conciliação entre ambas defendendo a coexistência entre
processos independentes e coincidentes, tal qual o paralelismo da ideia conexa
defendida por Koffka. Nesse sentido, Vygotsky tece considerações a respeito
dessas três categorias, a partir de uma análise do conceito de disciplina
formal de Herbart que caracteriza o conservadorismo na práxis educativa,
partido para a teoria da área de desenvolvimento potencial articulada com o
nível do desenvolvimento efetivo da criança que envolvem as funções
psicointelectuais, defendendo a existência do auxilio adulto na área
identificada como zona de desenvolvimento potencial.
Na análise da primeira categoria, Vygotsky entende
que para ela a aprendizagem é um processo puramente exterior e paralelo ao
processo de desenvolvimento, sem participar nem modificar, uma vez que a
aprendizagem utiliza os resultados do desenvolvimento. Esta é a teoria de
Piaget que estuda o desenvolvimento do pensamento da criança de forma
completamente independente do processo de aprendizagem. Piaget alega tratar-se
de uma questão de método ao defender que o curso do desenvolvimento precede
sempre o da aprendizagem e que esta segue sempre o desenvolvimento. Nesse caso,
a aprendizagem é uma superestrutura do desenvolvimento e essencialmente não
existem intercâmbios entre os dois momentos.
Analisando a segunda categoria, Vygotsky observa a
consideração de que a aprendizagem é desenvolvimento, considerando as leis do
desenvolvimento como leis naturais que o ensino deve ter em conta, exatamente
como a tecnologia dever ter presentes as leis da física, uma vez que o ensino
não pode mudar essas leis, do mesmo modo que a tecnologia não pode mudar as
leis gerais da natureza. Em vista disso, o desenvolvimento e a aprendizagem
sobrepõem-se constantemente, como duas figuras geométricas perfeitamente
iguais.
Ao analisar a terceira categoria que tenta
conciliar os extremos dos dois primeiros pontos de vista, assinalando uma
coexistência, Vygotsky entende que para essa categoria o processo de
desenvolvimento está concebido como um processo independente do de
aprendizagem, ao mesmo tempo que a aprendizagem é considerada coincidente com o
desenvolvimento, implicando, pois, numa teoria dualista proposta por Koffka ao
conciliar os dois pontos de vista anteriores que não se excluem, porque o
desenvolvimento é produto da interação dos dois processos fundamentais e porque
há uma ampliação da aprendizagem no desenvolvimento da criança.
Diante dessas três categorias, Vygotsky apresenta
uma análise a partir do fato de que a aprendizagem da criança começa muito
antes da aprendizagem escolar e que o curso dessa aprendizagem não é a
continuação do desenvolvimento pré-escolar, uma vez que este último pode ser
desviado, de determinada maneira, enquanto que a aprendizagem escolar toma uma
direção contrária. Pela sua importância, o processo de aprendizagem que se
produz antes que a criança entre na escola, difere de modo essencial do domínio
de noções que se adquirem durante o ensino escolar, isso porque a aprendizagem
e o desenvolvimento não entram em contato pela primeira vez na idade escolar,
mas estão ligados entre si desde os primeiros dias de vida da criança. Defende,
pois Vygotsky que há necessidade de se compreender a relação entre aprendizagem
e desenvolvimento em gral, para, depois, analisar as características
específicas dessa inter-relação na idade escolar. Para tanto, entende o autor
que a aprendizagem deve ser coerente com o nível de desenvolvimento da criança
e que ocorre na área do desenvolvimento potencial porque é fundamental e
incontestável que existe uma relação entre determinado nível de desenvolvimento
e a capacidade potencial de aprendizagem: o nível do desenvolvimento efetivo da
criança que é o nível de desenvolvimento das funções psicointelectuais da
criança, dependente, por consequência, da idade mental da criança. Assim, o
estado do desenvolvimento mental da criança só pode ser determinado
referindo-se pelo menos a dois níveis: o nível de desenvolvimento efetivo e a
área de desenvolvimento potencial: o ensino deve orientar-se com base no
desenvolvimento já produzido, na etapa já superada. Assim, a tarefa concreta da
escola consiste em fazer todos os esforços para encaminhar a criança nessa
direção para desenvolver o que lhe falta: o único bom ensino é o que se adiante
ao desenvolvimento. Todas as funções psicointelectuais superiores aparecem duas
vezes no decurso do desenvolvimento da criança: a primeira vez, nas atividade coletivas,
nas atividades sociais, ou seja, como funções interpsíquicas; a segunda, nas
atividades individuais, como propriedades internas do pensamento da criança, ou
seja, como funções intrapsíquicas. É aí que a linguagem se origina como meio de
comunicação entre a criança e as pessoas que a rodeiam. Como a linguagem
interior e o pensamento nascem do complexo de inter-relações entre a criança e
as pessoas que a rodeiam, assim essas inter-relações são também a origem dos
processos volitivos da criança. Nesse ponto de vista, a aprendizagem não é em
si desenvolvimento, mas uma correta organização da aprendizagem da criança
conduz ao desenvolvimento mental. A aprendizagem é um momento intrinsecamente
necessário e universal para que se desenvolvam na criança essas características
humanas não-naturais, mas formadas historicamente. Em vista disso, a
aprendizagem escolar orienta e estimula processos internos de desenvolvimento.
A tarefa real de uma análise do processo educativo consiste em descobrir o
aparecimento e o desaparecimento dessas linhas internas de desenvolvimento no
mento em que se verificam durante a aprendizagem escolar. Esta hipótese
pressupõe que o processo de desenvolvimento não coincide com o da aprendizagem,
o processo de desenvolvimento segue o da aprendizagem que cria a área de
desenvolvimento potencial. Por consequência, a aprendizagem e o desenvolvimento
da criança ainda que diretamente ligados, nunca se produzem de modo simétrico e
paralelo, uma vez que o desenvolvimento nunca acompanha nunca a aprendizagem
escolar e que cada matéria escolar tem uma relação própria com o curso do
desenvolvimento da criança, relação que não muda com a passagem da criança de
uma etapa para outra.
REFERÊNCIA
VYGOTSKY, L. Aprendizagem e desenvolvimento
intelectual na idade escolar. In: VYGOTSKY, L.; LURIA, A.; LEONTIEV, A.
Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo: Ícone/EdUsp, 1988.
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