(Ilustração de J. Lanzelotti, recolhida
do livro Estórias e lendas dos índios, organizada por Herbery Galdus, São
Paulo: Edigraf, s/d)
A
onça encontrou o raio, que estava fazendo um cacete. Ela veio por trás, pé ante
pé, e o raio não a pressentiu.
Chegando
perto, deu um pulo sobre o raio, mas não o atingiu. Pensava que era um bicho e
queria devorá-lo.
Então,
manhosamente, perguntou se ele era forte; o raio respondeu que não tinha força
nenhuma.
Então
o felino disse:
-
Pois eu não sou como você, tenho uma força enorme! Olhe aqui, cunhado, quando
eu quero, quebro tudo...
Trepou
numa árvore carimbe e quebrou os galhos.
A
seguir, subiu numa árvore paricá e derriçou tudo.
Desceu
para o chão, arrancou o capim e revolveu a terra com as garras, para mostrar
que era mesmo forte.
Depois,
parou cansada e disse, tomando fôlego:
-
Viu, cunhado? Eu sou assim. Sou forçuda, não sou como você.
Mas
o que ela queria era comer o raio. Para sondá-lo disse:
-
Agora, quero ver a sua força; se for capaz, faça o que eu fiz!
Mas
o raio, que era esperto, respondeu:
-
Não sou como você, não tenho força nenhuma!
Diante
disso, a onça tratou de se mostrar ainda mais: quebrou galhos, arrancou capim,
revolveu a terra.
Terminado
isso, sentou junto ao rio, com as costas voltadas para ele.
Aí,
o raio agitou o seu cacete, produziu faíscas, trovão, tempestade e muita chuva.
Corisco quebrou todas as árvores e a onça despencou no chão. Segurou-a pelas
pernas e atirou longe.
A
onça correu e foi esconder-se debaixo de um rochedo.
O
raio partiu todos os rochedos.
A
onça trepou de novo numa árvore. E o raio despedaçou todas as árvores.
Espavorida,
enfiou-se na toca do tatu gigante. Mas o raio veio atrás e fendeu a terra.
Assim ela correu sempre, escondendo-se aqui e ali, mas o raio ia à sua procura
e destruía tudo: árvores, rochedos, tocas de tatu.
Depois
a chuva e o vento fizeram que ficasse muito frio. E a onça enregelada, não pôde
mais correr.
Quando
o raio viu que a onça estava entregue, deitada no chão, enrodilhada, porque
todo o corpo lhe doía, deixou de persegui-la, mas falou-lhe:
-
Está vendo, cunhada? Eu sou assim. Também tenho força, mais força do que você!
Agora, vou-me embora...
Partiu
e deixou-a naquele estado.
Depois
ela levantou-se, gemeu e seguiu para casa.
É
por isso que a onça, ainda hoje, tem tanto medo de trovoada.
(Recolhido do livro Mitos e lendas dos índios
Taulipang e Arecuná, de Theodor Koch-Grünberg, na Revista do Museu Paulista,
São Paulo, 1953).
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