O NARIZ
ESPIRRÃO
Luiz
Alberto Machado
Era uma
vez um menino que era até bem apessoado e simpático. Mas tinha os olhos da
ambição e um nariz que espirrava que só.
Fosse
hora que fosse e ele: Atchin!
Na
escola, no meio da aula, ele com seu atchim! Atrapalhava a aula porque
espirrava, espirrava, espirrava tanto, dele não deixar ninguém estudar: atchim!.
Se fosse
festa de aniversário, ele chegava com seu: atchim!
Se fosse
na rua passeando pela praça, atchin!
Ora, não
havia tempo nem lugar, ele só: atchim!
Mas eis
que esse menino atchim ganhou um apelido: o nariz espirrão! E assim ficou,
nariz espirrão. Atchim! Vôte!?! Até eu já estou espirrando: atchim!
Pois
bem, esse menino cresceu e virou rapaz: atchim! Tornou-se homem feito: atchim!
E foi ficando doente de raiva de querer tudo que todo mundo possuía.
- Eu
quero! Atchim!
Primeiro
ele queria tudo, tudo o que fosse. Uma casinha linda que viu, conseguiu
expulsar uns velhinhos que moravam lá. Chegou lá, ele: atchim! E os velhinhos
correram fugindo de seus espirros cada vez maiores.
Aí ele
construiu em volta daquela casa tão bonitinha um muro tão alto, mas tão alto,
que não dava para saber o que tinha do lado de dentro, nem de saber quem mais
morava ali.
Um certo
dia ele viu um automóvel muito bonito. Espirrou e disse: - Atchim! Eu quero
aquele carro! Atchim! -, e tudo fez para ter aquele carro, até que o escondeu
dentro dos seus muros. E ninguém nunca mais viu nem o atchim nem o carro.
Outra
vez ele viu uma joia brilhante numa vitrine de loja, e ele: - Atchim! Eu quero
essa joia! Atchim! -, e tudo fez de novo para conseguir levar aquela joia e
esconder dentro dos muros de sua casa.
Assim
foi querendo e juntando coisas, levando, tomando, se apoderando das coisas de
todos da cidade, até que ninguém mais dali possuía nada e ele tornou-se
poderoso e com tudo de todo mundo. Ele tinha tanta coisa que resolveu sentar-se
e ficar olhando tudo que possuía: - Atchim! Agora eu tenho tudo de todos!
Atchim!
Certificou-se
ele de que não precisava de mais nada nem de ninguém. Não precisava de amigos,
de parentes, nem de nada, possuía tudo que precisava. E assim viveu por anos e
anos contemplando a sua ganância reunida e amontoada tudo ali para ser de seu e
de mais ninguém.
Aí teve
um dia que ele deu um espirro tão grande, mas tão grande, que tudo foi ficando
mudado, se gastando, se modificando. Quanto mais espirrava, mas as coisas se
modificavam, tornando-se coisas gastas ao seu redor. Era o tempo que levava as
coisas que ele tinha, desfazia tudo e entregava pro vento levar pra longe.
Passava
o tempo e não sabia ele que com o tempo passava as coisas que nasciam e que, pela
ação do tempo, também envelheciam, enferrujavam e se tornavam imprestáveis até
se acabarem de vez e sumir no pó dos ventos. E com seus espirros, cada vez mais
as coisas envelheciam e se gastavam até virar pó e cinzas que eram levadas pelo
vento.
- Atchim!
O tempo e o vento estão levando as minhas coisas! Atchim!
E a cada
espirro o tempo vinha, modificava as coisas até torná-las cinzas pra dar pro
vento levar.
Assim, o
tempo foi passando e tudo que era a riqueza dele, tornou-se coisas sem a menor
valia. Viraram pó, cinzas e foram embora com o vento, abandonando-o, deixando-o
sem mais nada.
Viu que
tudo que havia reunido ia embora sem poder fazer nada e as coisas que ficavam
não serviam mais para nada.
E ele: -
Atchim! Tudo meu está sumindo! Atchim! Está imprestável! Atchim! –, e ao
constatar que tudo estava se acabando ele começou a chorar e espirrar! Estava
ficando sozinho e sem nada. Tinha que fazer alguma coisa, pedir socorro,
procurar por pessoas para ajudá-lo.
Quando
ele abriu o portão dos seus muros e procurou gente para dizer o quão infeliz
ele estava por ter tudo que não valia nada, teve uma triste constatação: não
havia ninguém para ele conversar. Não havia ninguém para ele falar da sua
infelicidade, de sua tristeza permanente. Todos que não possuíam mais nada,
foram embora buscar melhorias noutra cidade. Ele saiu cada vez mais procurando
um a um para conversar, para dividir seu sofrimento, não havia mais ninguém. Aí
ele chorou de solidão. Estava sozinho: não tinha um amigo sequer para dividir
sua aflição.
Ele
muito triste resolveu voltar para casa e quando chegou às imediações deu por si
de que a sua casa que era tão bonitinha estava ficando tão usada, ruindo e até
chegar aos escombros. E agora? Como reconstruir tudo? Como reconquistar tudo?
Não havia nada nem ninguém para conquistar. Estava sozinho no mundo.
Foi aí
que ele percebeu que sozinho não era ninguém e começou a caminhar e andou dias
e mais dias até alcançar uma cidadezinha em que as pessoas viviam lá. Ele ficou
alegre! Percebeu que poderia contar sua história pras pessoas dali. E foi o que
ele fez. Assim fazendo percebeu outra coisa: não mais espirrava. Eita! Ficou
muito mais alegre: não tinha nada, mas estava curado e tinha pessoas para
conversar e dividir as suas emoções. E assim ele entrou pela perna de pinto,
correu pela perna de pato, ficou muito feliz e deu vez ao seu boato!