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Monday, July 15, 2013

ERA UMA VEZ CONTOS DE FADA...


ERA UMA VEZ CONTOS DE FADA... O REINO ENCANTADO DE TODAS AS COISAS


Era eu menino duns 5 ou 6 anos de idade, quando li Moby Dick, de Herman Melville numa brochura que encontrei na biblioteca do meu pai. Eu tinha uma curiosidade medonha para saber que segredo havia nos livros para meu pai viver debruçado sobre eles o tempo todo. Quando terminei essa leitura, encontrei Monteiro Lobato e devorei tudo. E de levada vieram as fábulas de La Fontaine, as história de Andersen, dos irmãos Grimm, Lewis Carrol, Perrault, Dickens e as Mil e uma noites. Logo me agarrei no volume do Robinson Crusoé, de Daniel Defoe, e emendei por uma coleção que meu pai possuía de Alexandre Dumas: Os três mosqueteiros, A tulipa negra, A casa de gelo. Uma maravilha!

Quando descobri as Viagens de Gulliver, do Jonathan Swift e fui devolvê-lo na estante, um outro volumoso me chamou a atenção: Dom Quixote, de Cervantes. Daí, virei um menino ávido por leitura, cada vez mais curioso e treloso de viajar nas imagens, criando meus personagens invisíveis que brincavam comigo e procurando por mais livros, isso incomodando tanto o meu pai que andava muito ocupado, me fazendo abusar da bondade da professora e bibliotecária Jessiva Sabino de Oliveira que me dispôs, pra meu deleite, toda biblioteca pública da minha cidade natal. Pode? Imagine, oxe! Era o mesmo que me entregar uma fábrica de brinquedos e guloseimas, tudo junto preu usar e abusar.

Por causa disso, histórias e lendas sempre me fascinaram, razão pela qual mergulhei de cabeça em coleções de lendas do Brasil, de Câmara Cascudo e tudo que aguçasse minhas invencionices por toda puerícia.

Mais tarde, quando eu adaptei para o teatro infantil o Valente Galozé da saudosa escritoramiga Elita Afonso Ferreira, com a criação das Edições Bagaço, depois de cursado Letras, que me debrucei em estudos sobre a Literatura Infantil. Foi quando li Bettelheim (1980), Franz (1980), Salem (1970), Coelho (1987), Bravo-Villasante (1977), Dieckemann (1986), Scha (1986), Cagnetti (1986) e Carvalho (1985), que fui tomando pé da situação e, por tabela, conjuguei estudos sobre teatro, música e educação infantis.

Entretanto, só quando estava na faculdade de Direito, que o então professor de Sociologia, Ivan Brandão, deu cloro nas minhas pesquisas a respeito do assunto. Que coisa, hem? Pois é, foram mais de 10 anos de pesquisa, redundando em compor umas músicas, adaptar uns textos teatrais e, finalmente, publicar o meu primeiro livro infantil, O reino encantado de todas as coisas, em 1992, pelas Edições Bagaço.

Estudos me levaram a entender que, em conformidade com Ginzburg (1989), Reis (2008), Biglia (2009), Vida (2008), Alves (2007), Borges (2011) e Aurichio (2012), que os contos de fadas são narrativas no tempo/espaço, aparentemente fora da realidade conhecida e que são fontes de inspiração, lidam com todas as experiências da vida diária, revestidas de fantasia no reino do faz de conta e que representavam uma metáfora da realidade.

Como muito bem diz Abramowicz (1998, p. 52) “Os contos desempenham uma função de mediação, de intermediários, desde a sua criação [...] uma mediação entre a oralidade e a escrita”, tornando-se, com isso, ferramentas que ajudam na preparação, no despertar e no entendimento da busca mística do domínio da vida. Enfatiza o autor que essas narrativas contribuem mais ainda para ensinar as verdades eternas, dando experiência para a vida.

Melhor as conclusões que trouxeram Mattar (2007), Carvalho (2009) e Fujimura (2006), entre outros, reiteradas por Ostrovsky (2011, p. 46), considerando a ideia de que essas histórias, contos, fábulas, causos ou fantasias, contribuem para a formação do ser humano, auxiliando na “[...] Aquisição do conhecimento, na revelação das diferenças, no cultivo da sensibilidade e da imaginação, expansão da linguagem, estimulo à inteligência, cultivo da memória e da atenção, estimulo à criatividade e ao desenvolvimento abstrato, interesse pela leitura”.

Esse estudo do Ostrovsky (2011) delineou os fundamentos básicos, a importância e os principais elementos e sua interpretação, bem como uma análise de algumas histórias.

A sua abordagem me fez reler Schaa (1986) enfatizando o estímulo da imaginação e o desenvolvimento da consciência e da imaginação na criança.

De fato, estudos acadêmicos dos mais diversos apontam para a importância da leitura de fábulas, contos, fantasias e narrativas infanto-juvenis por parte dos pais e filhos, notadamente pelos pais com o objetivo de fomentar o hábito da leitura na dimensão da sua convivência, contribuindo para um melhor desenvolvimento da formação dos seus filhos, bem como para possibilitar o enriquecimento de experiências no âmbito familiar.

Faço coro parafraseando Schaa (1986): literatura, teatro e música infantil são os melhores presentes para a garotada, por serem o verdadeiro reino encantado de todas as coisas.

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