Depois
de um dia de muitas brincadeiras, a meninada procurou Pai Lula para que ele
contasse uma das suas histórias maravilhosas. Foi, então, que ele sempre
solícito, acomodou a meninada no seu laboratório e começou a contar a Lenda do
Tsuru que ele ouvira contada por sua avó.
Era uma vez um camponês muito pobre. Vivia em
uma cabana tosca e seu único alimento eram algumas verduras que colhia de sua
terra cansada.
Um dia, ele encontrou um grow machucado, com
a asa destroçada. Por isso ele não podia voar e buscar alimento: isto o deixou
muito fraco, à beira da morte.
O camponês teve pena da ave, cuidou de sua
asinha e pacientemente colocou em seu bico algumas sementes. Sua bondade a
livrou da mote e quando ela pôde voar o camponês a soltou.
Alguns dias depois, uma mulher adorável
apareceu em sua casa e pediu que lhe desse abrigo por uma noite. O camponês,
por ser bom, não negaria esta caridade a ninguém, mas a beleza da mulher fez
com que ele acreditasse que deixá-la dormir em sua pobre cabana era realmente
uma honra. Os dois se apaixonaram e se casaram. A noiva era delicada, atenciosa
e tinha tanta disposição para o trabalho quanto era bonita, e assim eles viviam
muito felizes. Mas para o camponês, que já tinha muita dificuldade em viver
sozinho, ficou muito difícil cobrir as despesas que sua nova vida de casado lhe
trazia.
Preocupada com esta situação, a esposa disse
ao marido que produzir um tecido especial (tecer era um trabalho comum entre as
mulheres daquela época). Ele poderia vendê-lo para ganhar dinheiro, mas ela
alertou que precisaria fazer seu trabalho em segredo, e que ninguém, nem mesmo
ele, seu marido, poderia vê-la tecer.
O homem construiu uma pequena cabana nos
fundos de sua casa e lá ela trabalhou, trancada, durante três dias. O marido só
ouvia o som do tear batendo, e a curiosidade e a saudade que tinha de sua bela
mulher fazia com que estes dias demorassem muito para passar. Quando o som da
tecelagem parou, ela saiu com um tecido muito bonito, de textura delicada,
brilhante e com desenhos exóticos. A tecelã lhe deu o nome de “mil penas de
Tsuru”. Tsuru, ou Grow, é uma ave japonesa que lembra uma garça. É um dos mais
conhecidos símbolos da paz. Segundo uma antiga tradição oriental, fazer mil
grows em origami é um ato de esperança. Daí surgiu o habito de fazer uma
corrente de Tsurus para realizar desejos: a recuperação de um doente, a
felicidade no casamento, a entrada para a universidade, a conquista de um
emprego.
Ele levou o tecido para a cidade. Os
comerciantes ficaram surpreendidos e lutaram entre si para consegui-lo. O
vendedor pagou com muitas moedas de ouro por ele. o pobre homem não podia
acreditar que tão de repente a sorte começasse a lhe sorrir.
Desde então, a esposa passou a trabalhar no
valioso tecido outras vezes. O casal podia, com o fruto da venda, viver em
conforto. A mulher, porém, tornava-se dia após dia mais magra.
Um dia, ela disse que não poderia tecer por
um bom tempo. Ela estava muito cansada. Seus ossos lhe doíam e a fraqueza quase
a impedia de ficar em pé.
O camponês a amava muito e acreditava naquilo
que ela dizia, porém, tinha experimentado a cobiça e como havia contraído
algumas dívidas na cidade, pediu para que ela tecesse somente por mais uma vez.
No principio ela não aceitou, mas perante a insistência do marido, cedeu e começou
a tecer novamente.
Desta vez ela não saiu no terceiro dia, como
era de costume. E o homem ficou preocupado. Mas três dias se passaram sem que
ela aparecesse. E isso começou a deixar o marido desesperado.
No sétimo dia, sem saber mais o que fazer, ele
quebrou a promessa, espiando o serviço de tecelagem que ela fazia.
Para a sua surpresa, não era sua mulher que
estava tecendo. Arqueado sobre o tear encontrava-se um grow, muito parecido com
aquele que o camponês havia curado.
O homem mal pôde dormir à noite, pensando o
que teria acontecido com a mulher que amava. Amaldiçoava-se por ter sido
insaciável e praticamente ter obrigado a sua querida esposa a tecer mais uma
vez.
Na manhã seguinte, a porta da cabaninha se
abriu e o camponês com o coração aos saltos fixou seus olhos na porta,
esperançoso em ver sua esposa sair dela com vida. A mulher saiu da cabana com
profundas olheiras, trazendo o último tecido nas mãos tremulas. Entregou=a para
o marido e disse: - Agora preciso voltar. Você viu minha verdadeira forma,
assim, eu não posso ficar mais com você!
Então, ela se transformou em uma ave, o grow,
e voou, deixando o camponês em lágrimas.