A INFÂNCIA DE MURRAY – A infância do
psicólogo norte-americano Henry Murray (1893-1988) conteve rejeição materna,
elementos do conceito adleriano de compensação de um defeito físico e uma
sensibilidade além do normal ao sofrimento dos outros. Nascido numa família
rica, a sua infância foi marcada por lembranças que ele denominou de “lembrança
da essência do meu ser”, quando por volta dos quatro anos, observou a foto de
uma mulher triste sentada perto do seu filho, que também estava triste. Era o
mesmo tipo de foto sombria que Murray passou a utilizar posteriormente no seu
Teste de Apercepção Temática (TAT). A sua mãe lhe disse: “Foi a perspectiva da
morte que os entristeceu”. Ele interpretou essa lembrança como indicativa da
morte dos seus laços emocionais com a mãe, que o desmamara abruptamente aos
dois meses, preferindo, segundo ele, dar afeto aos seus irmãos. Ele insistia
que as atitudes da mãe o levaram à depressão que durou toda vida, condição que
formou a essência da sua personalidade. Referia-se à depressão como uma fonte
de angustia e melancolia, mas tentou mascará-la no seu comportamento cotidiano
adotando maneiras exuberantes, extrovertidas, alegres. A falta de ligação com a
mãe na infância levou-o a questionar o complexo de Édipo de Freud, porque não
coincidia com as suas experiências pessoais. Um outro fator o tornou sensível a
problemas emocionais e sofrimentos foi o seu relacionamento com duas tias
emocionalmente perturbadas. Murray era estrábico e aos nove anos foi submetido
a uma cirurgia realizada na sala de jantar da sua casa. O problema foi
solucionado, mas a lâmina do cirurgião escorregou e deixou-o sem visão
estereoscópica. Por mais que tentasse, jamais conseguiu praticar esportes,
porque não conseguia focar os dois olhos numa bola. Ele só soube dessa
deficiência visual ao cursar a faculdade de medicina, quando um médico lhe perguntou
se ele havia tido problemas ao praticar esportes quando criança. A deficiência
física e um problema na fala – gagueira – o levaram a compensar suas
limitações. Quando tentou praticar esportes, encontrou dificuldades e nunca
gaguejava quando tinha de indicar as jogadas. Ao ser derrotado numa luta na
escola, resolver ter aulas de boxe e venceu o campeonato local de peso pena.
Posteriormente admitiu que havia um fator adleriano agindo nesses esforços para
compensar suas deficiências na infância.
O DESENVOLVIMENTO DA PERSONALIDADE NA
INFÂNCIA – Com base na obra de Freud, Murray dividiu a infância em cinco
estágios, cada um deles caracterizado por uma condição agradável, que é
inevitavelmente limitada pelas demandas da sociedade e deixa a sua marca na personalidade
na forma de um complexo inconsciente, que comanda o desenvolvimento posterior.
Segundo ele, todas as pessoas experimentam os cinco complexos, uma vez que
todos passam pelas mesmas fases de desenvolvimento. Nada há de anormal neles,
exceto quando são manifestados ao extremo, uma situação que deixa a pessoa
fixada naquela fase. A personalidade não consegue desenvolver espontaneidade e
flexibilidade, uma situação que interfere na formação do ego e do superego.
Complexo é um padrão normal de desenvolvimento
infantil que influencia a personalidade adulta. Entre os estágios de
desenvolvimento na infância estão os complexos claustral, oral, anal, uretral e
genital.
Os complexos claustrais se encontram na
existência segura no útero.
Os complexos orais se encontram no prazer
sensual de sugar alimento enquanto se é segurado.
Os complexos anais são do prazer
resultante de defecar.
Os complexos uretrais são do prazer que
acompanha o ato de urinar.
Os complexos genitais ou de castração são
os prazeres genitais.
Os estágios de desenvolvimento são
denominados em conformidade com os complexos.
O estágio claustral: o feto no útero está
seguro, sereno e dependente, condições que se pode eventualmente querer
restabelecer. O complexo claustral simples é vivenciado como um desejo de estar
em lugares pequenos, aquecidos e escuros que sejam seguros e reclusos. As
pessoas com este complexo tendem a ser dependentes dos outros, passivas e
voltadas para comportamentos seguros e familiares que deram certo. A forma de
centros de complexo claustral por falta de suporte concentra-se nas sensações
de insegurança e desamparo, que fazem com que a pessoa tenha medo de espaços
abertos, queda, afogamento, fogo, terremotos ou simplesmente de qualquer
situação que envolva novidade e mudança. A forma anticlaustral ou de agressão
ao complexo claustral baseia-se na necessidade de escapar das situações
restritivas parecidas com as do útero. Ela inclui o medo de sufocação e
confinamento e se manifesta numa preferencia por espaços abertos, ar fresco,
viagem, movimento, mudança e novidade.
O estagio oral corresponde ao complexo
oral de socorro que apresenta uma combinação de atividades bucais, tendências à
passividade e a necessidade de ser apoiado e protegido. Entre as manifestações
comportamentais estão o sugar, beijar, comer, beber e uma necessidade de afeto,
solidariedade, proteção e amor. O complexo de agressão oral combina
comportamentos orais e agressivos, incluindo os atos de morder, cuspir, gritar
e a agressão verbal, como o sarcasmo. Entre os comportamentos característicos
do complexo oral de rejeição estão vomitar, ser enjoado com comida, comer
pouco, temer contaminação oral como pelo beijo, desejar isolamento e evitar
dependência dos outros.
O estágio anal compreende o complexo de
rejeição anal no qual há uma preocupação com o defecar, o humor anal e
materiais semelhantes às fezes, como sujeita, lama, argamassa e barro. A
agressão geralmente é parte deste complexo e é revelada nos atos de derrubar e
jogar coisas, disparar armas e detonar explosivos. As pessoas com este complexo
poder ser sujas e desorganizadas. O complexo de retenção anal manifesta-se no
acumulo, economia e coleção de coisas e na limpeza, arrumação e ordem.
O estágio uretral é exclusivo do sistema
de Murray, compreendendo o complexo uretral que é associado à ambição
excessiva, a um senso distorcido de autoestima, exibicionismo, ao ato de urinar
na cama, desejos sexuais e amor próprio. Às vezes é chamado de complexo de
Ícaro, figura mitológica grega que voou para tão perto do Sol que a cera que
estava segurando as suas asas derreteu. Como Ícaro, as pessoas com este
complexo sonham muito alto e seus sonhos são despedaçados pelo fracasso.
O estagio genital ou de castração
corresponde ao complexo de castração de forma restrita e literal do que na
forma de Freud, como sendo a fantasia dos meninos de que o seu pênis possa ser
cortado. Murray acreditava que tal medo nascia da masturbação infantil e do
castigo dos pais que poderia acompanha-la.
REFERÊNCIAS
SCHULTZ, Duane; SCHULTZ, Sydney. Teorias
da personalidade. São Paulo: Cengage Learning, 2014.